T E O R I A     (Referencial Físico Matemático)
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1. INTRODUÇÃO

A física da partícula estuda a matéria nas suas dimensões subatômicas. Veja na figura 1 como podemos observar desde os planetas de nosso sistema solar até as partículas que constituem os núcleos dos átomos.




Figura 1 - Ilustração de como enxergamos objetos à nossa volta, em termos de suas dimensões.


Então, para estudar partículas subatômicas, é preciso "quebrar" átomos, ou seja, utilizar um acelerador para gerar colisões entre partículas com velocidade próxima à velocidade da luz, e identificar as partículas (fragmentos) criadas neste processo, como ilustra a figura 2.

 

 

Figura 2 - Ilustração do processo de colisão entre partículas viajando em sentidos opostos a velocidades próximas à velocidade da luz. Nestas velocidades, suas energias se confundem com suas massas e é dada por E=mc2, segundo a teoria da relatividade (Veja o tema RELATIVIDADE).

Antes, porém, de investigarmos sobre os aceleradores de partículas, é preciso entender os princípios básicos de aceleração e confinamento magnético de portadores de carga.

 


2. MOVIMENTO DE UMA PARTÍCULA CARREGADA EM UM CAMPO ELÉTRICO UNIFORME

A força magnética não realiza trabalho sobre uma partícula carregada, ou seja, não lhe fornece energia, no entanto, altera a direção de seu movimento (ou seu vetor velocidade), confinando a partícula em regiões em torno das linhas de campo magnético aplicado. Mas então, quem acelera as partículas carrregadas? Quem realiza trabalho sobre os portadores de carga é a força elétrica, ou seja, é por meio do campo elétrico em determinada região do espaço que os portadores de carga ganham energia. No caso de um íon positivo, podemos acelerá-lo simplesmente inserindo-o em uma região onde exista um campo elétrico uniforme, como por exemplo, entre dois eletrodos separados por uma distância d e polarizados com uma tensão V (veja figura 3).

 


Figura 3 - Movimento de uma partícula carregada sob a ação de um campo elétrico uniforme (E=V/d - d é a distância entre os eletrodos).

 

O íon é acelerado pelo campo elétrico existente entre os eletrodos devido a uma força igual ao produto de sua carga pela intensidade do campo elétrico Fe=q·E. Sendo assim,

          (1)


há um incremento em energia cinética de uma quantidade igual ao produto de sua carga (q) pela diferença de potencial (V ) existente entre os eletrodos, ou seja:

Assim, o íon é acelerado pelo campo elétrico (V/d), sendo este proporcional à energia do íon, ou seja, quanto maior o campo elétrico, maior será a energia do íon.


3. MOVIMENTO DE UMA PARTÍCULA CARREGADA EM UM CAMPO MAGNÉTICO

a) Campo magnético uniforme

Se a velocidade de uma partícula de carga q e massa m for perpendicular a uma indução magnética uniforme B, então a força sobre a carga será:


          (2)

Onde r é o raio de Larmor, ilustrado na figura 4 para uma carga positiva. Para uma carga negativa, a deflexão é invertida.

 

Figura 4 - Movimento circular executado por uma partícula com carga positiva sob a ação de um campo magnético uniforme perpendicular ao vetor velocidade.
Fonte: Serway, 2003, Cutnell e Johnson, 2006.

 

Note que o raio de Larmor, que é o raio de confinamento da partícula, depende diretamente da massa e da velocidade da partícula. Isto significa que uma partícula com uma massa 1000 vezes maior, com a mesma carga e velocidade, possui um raio de Larmor 1000 vezes maior, para um mesmo campo magnético aplicado. Como exemplo, podemos citar um íon negativo de mesma carga que um elétron, mas que possui uma massa em torno de 1000 vezes maior. Então, para que possamos melhor confinar partículas carregadas com massas maiores que a do elétron, é preciso utilizar campos magnéticos mais intensos, reduzindo assim o raio de alcance destas partículas. Em regiões onde a velocidade das partículas é muita alta, como em um acelerador de partículas, é preciso utilizar ímãs super potentes ou mesmo ímãs supercondutores para garantir o confinamento magnético das partículas e evitar perdas para as paredes do reator.
O período do movimento circular é o tempo que a partícula leva para se deslocar uma vez ao longo do perímetro do círculo de raio r, ou seja:


          (3)



Note que o período não depende do raio, que é um fator muito importante em aceleradores de partículas circulares como o Cíclotron. A frequência do movimento circular, chamada de frequência de Cíclotron, é o inverso do período:


          (4)

 

Suponha, agora, que uma partícula carregada entra em um campo magnético com uma velocidade (v) que não seja perpendicular a B. Não existe componente de força na direção paralela a B, e, portanto, a componente da velocidade( ) nesta direção permanece constante. A força magnética sobre a partícula é perpendicular a , então a variação no movimento da partícula devido a essa força é a mesma discutida antes e resulta em uma trajetória da partícula helicoidal, como mostra a figura 5.

 

Figura 5 - Trajetória de uma partícula quando a velocidade não é perpendicular ao campo magnético.
Fonte: Serway (2003).

 

b) Campo magnético não-uniforme

Quando uma partícula carregada se move em um campo magnético não uniforme, que é forte em ambas as extremidades e fraco no meio, ela fica aprisionada e se desloca para frente e para trás em uma trajetória espiral em torno das linhas de campo. Exatamente como ocorre com as partículas aprisionadas pelo campo magnético terrestre (figura 6).

 

Figura 6 - Elétrons e prótons ficam aprisionados pelo campo magnético terrestre não-uniforme, formando os cinturões de radiação de Van Allen.
Fonte: Serway (2003).

 

c) Movimento de uma partícula sob campo elétrico e magnético uniformes e perpendiculares entre si

Quando a partícula carregada está em uma região em que coexistem um campo elétrico e um campo magnético, ambos uniformes, e perpendiculares entre si, a força que atua sobre ela é dada por:

          (5)

Se ambas as forças forem iguais e de sentido contrário, a velocidade da partícula será dada por:


          (6)

Na figura 7, são mostradas algumas configurações do campo elétrico e magnético sobre cargas positivas ou negativas que produzem forças em sentido contrário.


Figura 7 - Partícula carrega sob a ação de campos elétrico e magnético cruzados.

Fonte: <http://www.fisica.ufs.br/CorpoDocente/egsantana/elecmagnet/mov_campo/mov_campo.html#Movimiento en un campo eléctrico#Movimiento en un campo eléctrico>

 


4. ACELERADORES DE PARTÍCULAS


A descoberta da estrutura do átomo teve início no século XX. Descobrimos que o átomo era feito de fragmentos bem pequenos chamados partículas subatômicas: mais notadamente, o próton, o nêutron e o elétron. Entretanto, os experimentos conduzidos na segunda metade do século XX com os "quebradores de átomos", ou os aceleradores de partícula, revelaram que a estrutura subatômica do átomo era muito mais complexa. Os aceleradores de partículas podem pegar uma partícula, tal como um próton, acelerá-lo até quase a velocidade da luz, colidi-lo com um outro próton e, dessa forma, descobrir suas partes internas.

Existem dois tipos básicos de aceleradores de partículas:

  •  linear - as partículas são aceleradas em trajetórias retas;
  •  circular - as partículas viajam em trajetórias fechadas.

 

O acelerador linear é um tipo de acelerador que proporciona à partícula subatômica carregada pequenos incrementos de energia quando passa através de uma sequência secções tubulares polarizadas com campos elétricos alternados, como mostra a figura 8. Os ímãs mantêm as partículas confinadas em um feixe estreito ao longo do eixo dos tubos. Quando o feixe de partículas atinge um alvo no final do túnel, vários detectores registram os eventos: as partículas subatômicas geradas e a radiação liberada. Estes aceleradores são enormes e são mantidos no subsolo. O Laboratório de Stanford (SLAC) na Califórnia possui um acelerador linear com cerca de 3 km de comprimento, e acelera elétrons e pósitrons a energias em torno de 50 GeV (1 GeV=109 eV).

 

Figura 8 - O potencial das porções de tubo de cor vermelha é positivo e o das de cor azul é negativo, mas se alternam mantendo-se em fase com os íons, ou seja, quando o íon atingir o final do tubo 1, a tensão inverte, acelerando-o na direção do alvo. O mesmo ocorre ao longo de todas as regiões entre as seções de tubos.

Fonte: <http://www.fisica.ufs.br/CorpoDocente/egsantana/elecmagnet/movimiento/lineal/lineal.htm>


Os aceleradores circulares impulsionam as partículas, muitas vezes, ao redor de um caminho fechado. Quando as partículas estão em sua energia mais alta ou desejada, um alvo é colocado no caminho do feixe, ou feixes se cruzam na região dos detectores.

4.1 Cíclotron e Síncroton

O Cícloton, inventado em 1934 por Lawrence e Livingston, é um aparelho que pode acelerar partículas carregadas a velocidades muito altas. As partículas muito energéticas que emergem de um cíclotron são usadas para bombardear outros núcleos; esse bombardeio, por sua vez, provoca reações nucleares interessantes para a pesquisa nuclear. Muitos hospitais usam cíclotrons para fabricar substâncias radioativas, utilizadas no diagnóstico e no tratamento de enfermidades. A figura 9 mostra o diagrama esquemático de um cíclotron.

 

Figura 9 - a) O cíclotron é constituído por uma fonte de íons, duas peças em D, entre as quais se aplica uma tensão alternada, e um campo magnético uniforme.

b) O primeiro cíclotron inventado por Ernest O. Lawrence e M. S. Livingston, em 1934.

Fonte: Serway 2003.

 

O movimento das cargas ocorre em duas peças semicirculares, D1 e D2, conhecidas como os dês. Estes dês operam sob vácuo a fim de tornar mínimas as perdas de energia provocadas pelas colisões entre os íons e as moléculas de ar. Uma tensão alternada é aplicada entre os dês, e um campo magnético uniforme, gerado por um eletroímã, é orientado perpendicularmente ao plano dos dês. Os íons positivos, injetados em P, nas vizinhanças do centro da circunferência formada pelos dês, descrevem uma trajetória semicircular e atingem novamente esta região (entre os dês) em um intervalo de tempo de um semiperíodo T/2. A frequência da tensão aplicada se ajusta de modo que, se D2 estiver em um potencial mais baixo que D1, por uma grandeza V, os íons serão acelerados ao passarem para D2 e a respectiva energia cinética será aumentada de qV (neste caso, dizemos que a tensão está em fase com os íons). O íon então se move em D2 em uma trajetória semicircular de raio maior (pois sua velocidade aumentou). Depois do intervalo de tempo T/2 (um semiperíodo), chega novamente à região entre os dês. Neste instante, o potencial nesse espaço foi invertido (de modo que agora D1está negativo), e o íon recebe um novo impulso ao passar entre os dês. O movimento continua de modo que, em cada meia volta, o íon ganha uma energia cinética adicional qV. Quando o raio da órbita dos íons for quase igual ao raio das peças em D (raio do cíclotron), os íons, com muita energia, são ejetados do sistema através de uma fenda.

É importante notar que a operação do cíclotron se baseia no fato de o tempo de uma revolução ser independente da velocidade ou do raio da órbita do íon, como vimos na seção 3.a.


Podemos estimar a energia cinética máxima do íon, ao sair do cíclotron, em termos do seu raio R (raio dos dês). Como vimos:

         (7)


Então, a energia cinética (para v<<c) é dada por:          (8)

 

As equações anteriores são válidas somente quando a massa da partícula não varia com a velocidade. Quando a energia dos íons exceder a cerca de 20 MeV, (1 MeV=106 eV), os efeitos relativísticos começam a ser importantes, e as massas dos íons não são constantes e aumentam com a velocidade (veja o tema Relatividade). Por esta razão, o período da órbita aumenta, e os íons nas suas órbitas não ficam em fase com a tensão alternada aplicada. Para resolver este problema, construíram-se aceleradores onde se modifica o período da tensão aplicada, de modo que a tensão fique em fase com os íons. Mas a principal desvantagem do cíclotron é o fato de que as partículas seguem uma trajetória variável e a área da órbita deve estar totalmente imersa no campo magnético uniforme, necessitando, portanto, de ímãs grandes e fortes, muito dispendiosos. A alternativa foi criar uma sincronia entre campos elétricos e magnéticos de modo a manter o raio da órbita constante, com aplicação de campo magnético apenas na região da órbita. Daí nasceram os SÍNCROTONS, cujo esquema é mostrado na figura 10.

 


Fonte: Figura 10: Esquema de um acelerador Síncroton por campo de RF (rádio freqüência) e do sistema de focalização do feixe (quadrupolo magnético).

Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Síncrotron>

Estrutura de um Síncroton (veja figura 4.3):

  •  Dipolos: fornecem o campo B axial para curvar o feixe.
  •  Quadrupolos, sextupolos, ...: focalização do feixe.
  •  Cavidades de RF (fonte de tensão alternada com frequências da ordem de MHz-Rádio Frequência): adicionam energia ao feixe.

 

Funcionamento:

Nos Síncrotons, as partículas são aceleradas dentro de um campo eletromagnético até atingirem altos níveis energéticos, e depois são colididas com outras partículas que viajam em sentido contrário, pois a eficiência em energia é muito maior comparada a aceleradores que utilizam alvos fixos, como mostra a figura 11. Neste caso (feixes cruzados), a energia total avaliada é o dobro da energia de cada feixe. Quando os feixes de partículas viajam dentro do anel de colisão, eles são aceleradas pelos campos elétricos, sendo estes proporcionais à energia das partículas, ou seja, quanto maior o campo elétrico, maior será a energia da partícula. Para que os feixes de partículas passem pelas câmeras de aceleração (a vácuo) várias vezes, elas precisam ser circulares. Os feixes se cruzam nos detectores ao serem confinados por intensos campos magnéticos. É nesta região que as colisões ocorrem e onde os fragmentos são identificados.

 

Figura 11: Ilustração que compara a energia total avaliada nos processos colisionais entre dois feixes de prótons (íons de hidrogênio) viajando em sentidos opostos e entre um feixe e um alvo fixo.

Fonte: SPRACE.

 

Focalização do feixe

Os ímãs, tanto os eletroímãs convencionais ou os ímãs supercondutores, são colocados ao longo do tubo do acelerador em intervalos regulares. Estes ímãs mantêm o feixe de partículas confinado e focalizado. Imagine o feixe de partículas como bolinhas de chumbo atiradas de uma espingarda de chumbinho. Normalmente, as bolinhas (partículas) tendem a se espalhar. Se as bolinhas são dispersas, então elas não provocam muitas colisões em uma pequena área do alvo. Entretanto, se as bolinhas são confinadas por uma força externa (magnetismo) para um caminho estreito, então elas provocarão muitas colisões em uma área estreita do alvo. Quanto mais colisões, mais acontecimentos são observados em qualquer experiência. Os ímãs geram um campo dentro de seu núcleo. Não há força magnética no centro em que as partículas viajam. Se as partículas se extraviam do centro, elas sentirão uma repulsão magnética para o eixo. Organizando os ímãs em uma série de polos alternados, as partículas podem continuar confinadas pela extensão do tubo, como mostra a figura 12.

 

Figura 12: Os ímãs são organizados com os polos opostos para confinar o feixe de partículas.
Fonte: SLAC.

Muitos aceleradores circulares também têm um acelerador linear curto para acelerar inicialmente as partículas antes de entrarem no anel. Um exemplo de um acelerador circular moderno é Tevatron, um acelerador de partículas circular (ou síncrotron) situado no Laboratório Nacional do Acelerador Fermi (em inglês - Fermilab) em Illinois, que ocupa quase 25,6 km², e consegue acelerar prótons a energias de 980 GeV. É o acelerador que detectou pela primeira vez o quark top. O quark é um dos dois elementos básicos que constituem a matéria (o outro é o lépton).

 

4.2 Aceleradores Hadrônicos - LHC (Large Hadron Collider)

Um hádron (palavra de origem grega que significa "forte") é uma partícula capaz de interagir por meio da força nuclear forte, e é constituída por quarks, logo, está inclusa na Teoria da Cromodinâmica Quântica. Exemplos de hádrons são o próton e o nêutron.

O LHC é um acelerador de partículas moderno, que entrou em operação pela primeira vez em setembro de 2008. Contém dois tubos gigantescos a vácuo, que se encontram nos detectores, dispostos lado a lado para acelerar prótons em sentidos opostos. Os tubos estão envolvidos por 1232 dipolos magnéticos supercondutores que curvam o feixe, também por vários quadrupolos para focalização do feixe e por multipolos magnéticos para correção. Átomos de hidrogênio ionizados (prótons) são postos a girar e podem atingir energias da ordem de 7000 GeV (7 TeV). Você pisca o olho e essas partículas dão 10 mil voltas nos 27 quilômetros do tubo. Um dos principais objetivos do LHC é tentar explicar a origem da massa das partículas elementares e encontrar outras dimensões do espaço. Uma das experiências a serem realizadas pelo LHC envolve a partícula bóson de Higgs, também conhecida como partícula de Deus. O bóson de Higgs, previsto até agora somente em teoria, poderia explicar por que a matéria possui massa, ou seja, por que existimos. Se a teoria dos campos de Higgs estiver correta, ela será confirmada pelo LHC. Veja na figura 13 uma ilustração dos processos colisionais no LHC.

 

Figura 13 - Processos colisionais gerados no LHC. A energia total gerada entre a colisão de apenas dois feixes é de aproximadamente 14.000 GeV.
Fonte: SPRACE.

 

Características do LHC

  • Construído a 100 metros de profundidade no Túnel do antigo LEP (Large Electron-Positron Collider) pela CERN-Organização Europeia de Pesquisa Nuclear.
  • Circunferência de ~ 27 km (76% do território de toda USP).
  • Acelerador do tipo síncroton.
  • 1232 dipolos, comprimento 14.3 m, massa 35 toneladas.
  • Campo do dipolo: de 0.535 a 8.33 T (200000 vezes o campo magnético terrestre).
  • Raio efetivo de curvatura: 2804 m.
  • Frequência de revolução do feixe: 11.425 kHz.
  • Frequência RF: 400.8 MHz.
  • Um bilhão de colisões próton-próton por segundo.